15 outubro 2011

Frederico Füllgraf - Marilu, a Mata Hari da FARC




Frederico Füllgraf


Vestiu uma blusa de fino algodão, decotada, mal domando seus dois frutos rijos, aprisionados, introduziu-se num tailleur justo, que lhe esculpiu as curvas saradas e – cúmulo da luxúria anunciada - carregou nos lábios aquele batom com a tonalidade da carne, concupiscente. E foi à luta, digo: ao quartel, oferecer os seus serviços.

As preliminares remetem a Pantaleão e as visitadoras, aquele filme peruano, adaptado do romance de Mario Vargas Llosa, cujo protagonista, o valente capitão, arrinconado nas profundezas da Amazônia, bota ordem na pornéia, profissionalizando a fornicação. É verdade que a floresta é a mesma, a soldadesca aquartelada ama zona, mas a Marilú que foi à guerra é colombiana. Compareceu como especialista em relações públicas e, arrebatados, os camaradas dispensaram o aborrecível currículo e as mentirosas referências escritas. Convenceu-os sua... “apresentação de armas”.

Patente coruscante – olhar lúbrico, peito e bunda triunfantes –, “sus encantos hicieron que rapidamente se ganara la confianza de la superioridad”, resigna-se, nostálgico, um recruta, e logo a morena pousaria na foto de graduados coronéis e generais como a loura do pirata. Desaforada (cara-de-pau aplica-se também à fêmea impudente?), infiltrou-se num curso de Inteligência da Escola de Guerra e a partir daí ascendeu até o cargo de vice-diretora de La Dorada, prisão de segurança máxima para narcotraficantes, paramilitares e “insurgentes” (Hugo Chávez), tropeçando em seus corredores com sumidades como Rodrigo Granda, o liberado “chanceler” das FARC.

Jamais levantaram suspeitas, nem mesmo quando explodiu aquela bomba no estacionamento da Escola, cobrindo de estilhaços e terror o dia 19 de novembro de 2006. E sobreveio então aquele inusitado revide do exército, em meados de 2007: durante o enfrentamento, o azarão Carlos Antonio Lozada, chefe de uma coluna Brancaleone, perde sua agenda eletrônica e lá estava Marilú; com nome, endereço e telefone... Don Álvaro em pessoa anunciou o indiciamento de Marilú (sobrenome de paz Ramírez) por “terrorismo, rebelião e formação de quadrilha”. Matreiro, fê-lo apenas em novembro, quando já se armava a lona para o grande circo midiático de Villavizenzio, ponte aérea do resgate dos reféns das FARC, em cuja aritmética 1 + 1 = 3, pois Emmanuel, o filho bastardo da Colômbia, já estava sob a custódia do Estado desde 2005.

E enquanto do fundo da mata a choldra rebelde continuava atirando pedras em Lozada, o Estulto (cretino, mané, molongó, pacóvio!), os homens de Don Álvaro Uribe, o Durão, rastrearam sua agenda e ¡joder!: - não é que reconheceram mais quatro atrevidas penetradoras?  Obedeciam todas ao mesmo figurino: mulheres jovens e bonitas aproximam-se de uma guarnição militar, e da sentinela fraquejante, pelos tenentes baba-ovos aos coronéis mulherengos, a hierarquia implode e a “penetração” se consuma... É quando elas abrem o jogo, mas não o zíper, oferecendo aos repulsivos milicos serviços profissionais que não os horizontais, como relações públicas, assessoria de imprensa ou assistência  social; sem nunca esquecer no olhar lânguido, resvaladiço, uma janelinha aberta para just in case...

Foi o caso da descolada, que durante vários meses chefiou a assessoria de imprensa de uma importante unidade militar em Bogotá. Por razões óbvias os militares mantiveram sua identidade em sigilo: inverteu-se o jogo, agora era ela a penetrada, bombardeada por perfurantes interrogatórios... Outra guerrilheira burlou os controles de segurança do aparatoso exército de Uribe, movido a US-Aid, e credenciou-se em cinco eventos de alto nível da Escola de Guerra em 2006. Num deles chegou a trocar olhares – “y quizás algo más” - com Don Álvaro, ninguém menos que o odioso presidente da República. “Odioso”: adjetivação apaixonada, pronunciada com ideológica convicção, mas como pensamento sob severa proibição – e se as traísse um imperdoável ato falho? Alarmadas e mais sortudas que a compañera Marilú, as quatro espiãs que vieram de cafarnaú escaparam para a noite fresca, antes que o fogo amigo lhes chamuscasse as serpejantes cadeiras. Já Marilú, dizem, trocou sua bandeira. Tudo agora é espera pelo trovador de uma salsa brejeira - a da potranca de Tróia, “que se fue con un milico”, a lendária Mata Hari guerrilheira...

Em tempo: “penetração” é linguagem politicamente incorreta e ordem superior do Capitão-Gancho Marulanda, o saudoso “Tiro Fijo” da farândola revisionista, hoje reles extorsionista: responder ao poder de fogo do inimigo com a arma milenar de mulheres fogosa - eis a tática. Porque a carne (de desafetos e afeiçoados também) é fraca e – intercursos à parte, “consentidos” por reféns – o campo de batalha não é convento de clarissas! Leitor tardio de Greene e Le Carré, “Tiro Fijo” baixara dez mandamentos para as aspirantes à missão: as introduzidas devem ser “chamativas, melosas e dicharacheras” (enfeitiçadoras) e usar, principalmente nos primeiros encontros, “roupa atrevida”: uma última conferida diante do espelho, bater continência e...¡penetración o muerte, venceremos!  

Publicado pelo jornal El Tiempo, transcrito pela imprensa hispânica de todo o continente e, como sempre, hilariante estória ignorada pela ignávia e borrega “mídchia” brasileña, a impudica ordem do dia não deixou dúvidas: “Ali, em meio ao recrutamento de civis e das tentativas dos militares em mostrar sua melhor cara, pode então efetivar-se a penetración”...

Acorrentado Marx, vendado Freud, sorri a metáfora da guerrilha-pornô. 

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